segunda-feira, 9 de julho de 2012

30 minutos


                De repente tudo o que ele precisava era da noite. Respirar o ar frio e escuro o acolhia de alguma forma que só ela. Resolveu abrir os olhos. Olhou no relógio, passara das 3h, ainda era tempo. Pensou ainda por várias vezes se levantava ou ficava. Se Virava para o lado ou para si mesmo.
                Ergueu a primeira das cobertas. Usava duas, fazia muito frio. Sentiu diminuir o peso sobre seu corpo. Sabia que dali a pouco sentiria um leve gelar sobre sua pele. O tempo se esvaía, era preciso decidir. Ir ou ficar? De um súbito atirou a segunda coberta para o outro lado da cama e se sentou à sua beirada.
                Com as mãos ao lado do corpo, apoiava-se na cama, a cabeça baixa, como quem respira para tomar coragem. Respirou profunda mente. Uma, duas, na terceira vez abriu os olhos de repente e levantou a cabeça. Esfregou o rosto nas mãos, passando-as em seguida pelos cabelos, enquanto tornava a fechar os olhos. Precisava de uma ducha.
                Entrou no banheiro e fechou a porta rápido por causa do frio. Ligou o chuveiro e se sentou sobre a tampa do vaso. Sempre aproveitava a latrina para pensar, independente do motivo que o levava a ela.
                Enquanto o vapor timidamente tomava conta do pequeno ambiente fechado, a covardia de tirar a roupa enfraquecia lentamente. Temia o frio. Temia encolher-se só. Aproveitou um repentino surto de parca coragem e retirou a blusa, que escorreu por suas costas, pendurando-se no cano do vaso, logo atrás. Sentiu a pele eriçar-se rapidamente. Teve medo. O frio sempre o lembrava a sensação de medo. E como quem se protege do medo e do frio, levou as mãos aos braços quase por reflexo, esfregou-os. O frio não passava. Quis colocar a blusa de volta, mas o som das gotas golpeando o chão do Box o lembrava de seu propósito ali. Devia ir à rua. Não sossegaria a cabeça sem mais uma dose de noite.
              Sorveu do frio toda sensação. Queria vivê-la. Sentir apenas o frio, não só o medo.
              Tirou a camiseta. Com o torso nu, apenas suas pernas permaneciam de um modo ainda protegidas. Debatia o corpo magro numa tentativa inconsciente de conter o frio. Tentava, por sua vez, suprimir os tremores. Queria sentir o frio, queria a plenitude.
              Levantou-se, mirou-se no espelho. Podia ver desde os olhos até a altura dos joelhos.
              Num movimento leve, despiu completamente as pernas.
           Completamente nu, mirou o reflexo embaçado do corpo magro no espelho. Lembrou-se dos tempos de menino, quando seu reflexo o ofendia com a própria magreza. Hoje não mais. Hoje via beleza mesmo no corpo inquieto pelo frio.
             Virou-se de costas, esperou por um tempo parado, como quem deixa as próprias costas mirarem-se no vidro embaçado.
              Caminhou pé ante pé até a cortina do Box, sentia penetrar-lhe as solas dos pés cada fina agulha de frio do piso de louça.  
                

quinta-feira, 21 de junho de 2012

A Era da Desformatação?

Hipsters x Mainstream
"O Sistema" x "A Rapa" [não gosto do modelo "direita x esquerda"...acho que ele é obsoleto, reducionista e mais distrai e tira o foco do que realmente importa do que qualquer outra coisa.]
Eu x O mundo

Eu não sei se isso se deve à minha classe social, ao meu nível instrucional [afinal, conviver no meio acadêmico no Brasil hoje faz uma diferença fodida quando se pensa em referência dentro de um país de realidades sociais tão precárias e discrepantes], ao meu círculo de amigos, ou ao meu acesso à internet; mas eu vejo, e cada vez com mais frequência, onda após onda de pessoas, movimentos, ideologias, pensamentos de oposição, revolução, resistência, chame como quiser. Eu vejo um movimento de inconformismo, de tentativa de mudança, de questionamento daquilo que vigora, do que é de maioria, do que é hegemônico.

Nunca tinha ouvido tanto falar em questionamento de valores quanto nos últimos anos. Talvez seja pelas crises financeiras consecutivas, mostrando talvez a fragilidade desse nosso sistema de produção, ou, em última análise, a fragilidade do homem em si, na sua busca incessante pelo poder. Tanto que até o seio do pensamento mantenedor do sistema [Europa e EUA] manifesta movimentos de revolta, de questionamento. Pessoas vão às ruas, ativistas - reais ou virtuais - pipocam pelo mundo a fora. O facebook vive repleto de charges, imagens, frases, banners com frases ou ideias que visam questionar o nosso sistema, o modo como pensamos, o modo como nos vestimos, aquilo que valorizamos, defendemos, condenamos, a concepção de mundo que hoje se torna senso comum.

E eu não sei de novo se é sorte ou mera questão de afinidade, mas eu tenho contato muito grande e cada vez maior com pessoas que tentam se afirmar num mundo que os desfavorece. Pessoas que, em maior ou menor grau, estão à margem do que é majoritário, pelo seu modo de pensar e conceber o mundo. Vejo nessas pessoas, seja isso de fato honesto e autêntico ou não, uma sede imensa em combater o atual senso comum, pois ele nos desfavorece [e aqui eu me incluo no grupo desses "marginais", que não necessariamente passam fome ou frio, mas vivem com uma sensação constante de deslocamento dentro da maioria]. Isso me lembra uma frase que eu vi, inclusive, no facebook: "I'm not anti-system, the system is anti-me" ["eu não sou anti-sistema, o sistema é anti-mim"]. Mostrando o espírito-guia daqueles que se movimentam em combate ao que é majoritário: Nós nãos nos sentimos contemplados pelo sistema, pelo nosso modelo de sociedade. Não podemos ser nós mesmos sem sermos olhados de lado, tortos, como doentes sociais por discordarmos da maioria, por enxergarmos loucura na dita - se não imposta - normalidade; por encontrar abrigo, familiaridade e casa no que é tido como bizarro, esdrúxulo, incomum. Não nos conformamos com o modelo academicista que dita, pela sua leitura de conhecimento, o que é "Verdade" e o que não é. Não aceitamos o valor absurdo que se dá ao dinheiro enquanto vivemos tão carentes de afeto, respeito, aceitação. Não somos felizes, não nos sentimos aceitos. Queremos amor, paixão! Queremos nos sentir de fato vivos e não escravos-zumbis submetidos a uma rotina extenuante que serve muito mais à manutenção desse sistema que nos suga a vida por todos os poros, nos impõe a apatia sem que possamos tirar o sorriso - já amarelado - do rosto do que à nós mesmos. Vivemos a "ditadura do ótimo" dentro de uma vida miserável! Pais não tem tempo para desfrutar com seus filhos. Estudantes não tem tempo de viver para além da academia, trabalhadores vêem no sono sua única e real fonte de lazer. Não existe tempo livre, não existe espaço para a vida! E nesse contexto, nós clamamos pela desformatação! Pela desconstrução do mundo que hoje se apresenta diante dos nossos olhos e não nos serve, nos mata aos poucos, nos consome! Nunca se falou tanto em sucesso, que hoje é visto como algo "acessível a todos" e, portanto, de responsabilidade única do indivíduo, já que as "oportunidades estão lançadas" [Não vou nem discutir aqui a veracidade dessa afirmação de igualdade de acesso a oportunidades]. Mas que sucesso é esse? Que tipo de mundo é esse que vê num "Roberto Justos" um exemplo a se seguir? O executivo de sucesso, acumulador de dinheiro e poder em suas mãos, meu deus, minha gente....Como pode a nossa vontade de luxo ser maior que a compaixão com a miséria que se mostra todos os dias nas ruas, na tevê, no nosso vizinho, na nossa calçada, em nós mesmos? Como pode o desejo de ostentação superar a vontade de ver o mundo com menos injustiça? E o que nós ganhamos com tanto sucesso?? Tanto tempo gasto para acumular o máximo de dinheiro que conseguirmos pra quê? Às vezes não sobra nem tempo para gastar esse dinheiro. E pra quê tanto dinheiro?? "Ah, mas eu quero viver de luxo, quero conhecer lugares chiques, exóticos, as maravilhas do mundo; quero morar numa casa confortabilíssima, casa-cláudia; quero dirigir um V8 5.1 e roncar meu motor na frente da balada pra mostrar pra todo mundo como eu sou fodão. Todo mundo quer isso!" E de onde vem esse modelo?? É UM MODELO!! Uma merda de um modelo, uma merda de uma ideologia, que, tal qual todas as outras, é vendida, montada, construída. Não é natural, não é intrínseco ao ser humano. É construído. E, sendo assim, passível de questionamento e discordância.

Hoje somos vários, ainda que minoria, que não querem, são contra. Não aceitamos o mundo como ele se apresenta. Não temos - ainda - uma proposta substituta. "Eu não sei o que eu vou fazer, mas sei o que eu não vou fazer, aqui eu não fico mais" - Marinho, Eduardo [http://www.youtube.com/watch?v=NMn_1rQ3sms]. Mas sabemos o que não nos serve e sabemos o que queremos! Queremos espaço! queremos poder ser, independente de como. Queremos liberdade real para nos expressarmos, dar vazão à nossa humanidade. Queremos ser de fato felizes! Não esse modelo absurdo e imposto presente nas propagandas, filmes, novelas, telejornais, rádios... Queremos o direito de nos afirmarmos tal qual somos de fato! Sem conformismos, sem formatações à opressão.

Somos os incomodados, somos os que incomodam. Nossa cor incomoda, nosso cabelo incomoda, nosso cheiro incomoda, nossas palavras, nossas ideias, nosso posicionamento. Somos o câncer, a doença. Nem me venha com a sua cura! Se ser saudável é submissão a um modelo de sociedade doentia, prefiro ser doente, prefiro ser louco, prefiro bater no peito e me declarar marginal, com muito orgulho!

Resistimos como podemos. Não queremos tomar o poder, queremos aniquilá-lo. Chega de submissão, chega de sermos subjugados, desmerecidos, diminuídos.

Queremos a vida, queremos o eu, queremos você também, todos nós, nosotros, juntos, livres para poder ser, para poder amar, para poder viver.

E enquanto não pudermos sê-lo, nós vamos incomodar! 


domingo, 10 de junho de 2012

Empatia

Esse fiozinho, esse laço, essa massa entre as pessoas
Essa coisa que nos une, nos aproxima
Bem precioso, difícil de encontrar

É construção...é dia após dia após dia após dia...

todos os dias...

é encontrar no outro um lugar comum aos dois

E nesse lugar comum, ser livre para poder ser

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Sintonia

é só chamar...

em voz, em mente, em alma....

todos os ouvidos abertos..

em sintonia

domingo, 13 de maio de 2012

mais paradoxos, menos prozac

Eu fico aqui pensando sobre algo que acontece...ou pelo menos acontece comigo....outros podem se identificar ou não...

Normalmente quando eu erro, ou me sinto errado, ou apontam meu(s) erro(s), eu me sinto automaticamente sem o direito de me colocar, de colocar o meu ponto, a minha posição...Numa logica meio perversa de "se eu estou errado, não posso estar certo". Dicotômico, né?

E isso me faz pensar nas relações como um todo...em como é comum o estabelecimento de um certo maniqueísmo diante dos conflitos nas relações...porque a recíproca do pensamento acima entre aspas também é bem frequente ["se eu estou certo, não posso estar errado"].

E essa forma binária de pensar e se relacionar acaba cristalizando as relações...e cria papéis ilusórios de pretensões permanentes, polariza as coisas....existe alguém com razão, com vez e voz, em contraposição a outro alguém, sem razão, nem vez, nem voz...

E é um posicionamento confortável, né? Em ambas as situações...tanto para o que se encontra por cima, por não ter seus pontos delicados questionados; quanto pelo que se contra por baixo, na medida em que permanecer por baixo, por mais humilhante que seja, atenua a necessidade de movimento do indivíduo, que entra no ciclo de "eu sou uma desgraça mesmo, de que adianta tentar qualquer coisa?". Isso por si só é um modo - muito bem disfarçado - de comodismo.

E por que é tão difícil quebrar esse pensamento vicioso e simplista da existência de um "certo", único e inquestionável, e outro "errado", absoluto e condenável?? Nós sabemos, pelo menos superficialmente, do caráter complexo da constituição humana e de suas relações...o que torna tão difícil aplicar essa concepção no dia a dia? Será nosso vício no pensamento binário maniqueísta? Será preguiça? Será medo? O que será?

Às vezes penso ser impossível manter relações de fato dentro desse modelo simplista.....
Como se estivéssemos presos...acorrentados...

e uma vontade de arrebentar as correntes...liberar a vida...e todas as suas características....

quebrar a dicotomia...

"ou é branco, ou é cachorro"

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Hiato

Ah, passarinho...vem pra cá....vem...
Fica aí, na janela, só me olhando....
olha pra mim, olha pra fora..

sempre vem  me visitar....
às vezes sei que vem...
outras, vem assim, que nem ladrão....

me rouba de mim...
mas só por um instante...
e volta pra janela..
e olha...

olha....

só olha
"é pavê, não é pá comê"

e nessa de ficar com fome a gente sempre se volta pra si
não dá pra comer as entranhas...
ia doer...

mas dá pra olhar pra dentro
e ver o mundo

terça-feira, 1 de maio de 2012

Fístula

Meio hermético, meio escatológico, meio sujo, meio nada...

Sei lá...acho que eu só precisava escrever...me libertar sei lá eu do quê...
Colocar pra fora sim...sim..o pus? Não sei..não sei ao certo se é isso mesmo, acho que não...só a necessidade de escrever mesmo, fluxo de consciência hermético, sem compromisso, só pra aliviar a pressão. De quê? Não sei também...aqui para descobrir, ou talvez esquecer, com sorte, resolver...mas ah, que sorte a minha seria resolver..acho que não...só aliviar a pressão mesmo? de onde veio? não sei. Na verdade sei, não quero falar, não aqui, não é o lugar, nem o momento....incômodo de súbito, mas com causa, bem definida por sinal, inevitável, eu diria..triste, com uma leve esperança de nunca acontecer...ou quem sabe uma esperança de ser negada no futuro, substituída...desperdício..é, desperdício...não bem desperdício, talvez desvalorizado seja melhor, mas ainda não, ambas muito fortes, nada tão dramático assim também...tempestuoso...o nome da música que toca agora [Tempest..fala melhor que qualquer palavra posta por aqui]..tempo, tempo...quanto tempo até as coisas se acertarem? um dia se acertarão, será? Parte de mim espera que não, parte de mim gosta é do movimento, do barulho, mais do som, na verdade, barulho não, nem turbulência, nem ruído..só o som...que não é o silêncio...a resolução tem um ar de silêncio que me angustia...enquanto as coisas não se resolvem, ainda há som..e enquanto há som, há esperança! Esperança! Ah, a palavra chave! Em quê? Na vida, em mim, em tudo...esperança....nossa última fagulha..acendedora de fogueiras....

Pronto, achei o que eu procurava!

Obrigado.

terça-feira, 24 de abril de 2012

sexta-feira, 13 de abril de 2012

"Rios, Pontes e Overdrives"

Um insight - muito provavelmente óbvio - que acabou de me ocorrer...

Já percebeu o quanto acontece de nós convivermos não com as pessoas, mas com projeções que fazemos delas?
Aí você pode perguntar: como assim?

Assim: Convivemos com as pessoas, as conhecemos e conforme as vamos conhecendo, por motivos diversos, pode acontecer de nós acabarmos colocando na relação cargas emocionais que formam algo como uma película sobre a pessoa com a qual nos relacionamos, de modo a não a vermos mais em si, mas a concebê-la através das nossas impressões construídas sobre ela.

Muitas vezes essas impressões podem ser errôneas, ainda que pautadas em fatos observados e experiências realmente vividas. Às vezes vivemos com uma pessoa um recorte dela e a partir desse recorte e - acredito eu - por falta de outros inputs para construção de uma imagem mais completa, caímos numa armadilha metonímica, definindo a pessoa, catalogando-a nos nossos "sistemas relacionais" a partir desse recorte, como se ele fosse o todo, não apenas uma parte, ou ainda mera distorção.

Isso acaba por dificultar ou por vezes impedir o relacionar entre as partes, uma vez que ocorre um mútuo desconsiderar o indivíduo, valorizando as impressões e distorções. Ambas as partes se sentem - mutuamente com razão - desconsideradas, desrespeitadas, não vistas e, ao mesmo tempo e, muito provavelmente, pelo desgaste emocional que essa dinâmica gera, acabam por reforçar cada vez mais fortemente essa "película" de impressões e recortes [e eu quero ressaltar, muitas vezes errôneos] e a usar isso, de certa forma, para agredir a outra parte, no intuito, consciente ou não, de uma retaliação pelos danos causados [uma espécie de "vingança" ou um tentar fazer com que o outro se sinta na nossa pele para que possa compreender nosso lado, nossos sentimentos, nossa posição - um mecanismo que, dentro desse contexto, se mostra extremamente falho e desgastante para ambas as partes]. E no fim das contas existe o enorme risco de não haver mais duas pessoas se relacionando, mas meramente duas películas construídas através do olhar do outro que não reflete com fidelidade o que esse outro de fato é.

Incompreensões, frustrações e desgastes.

Eu me incluo em tudo nessa dinâmica, vítima e algoz, e acho que esse duplo enquadramento deva ser de certo modo geral, comum a várias pessoas, se não todas, de acordo com situações especificamente desfavoráveis ao desenvolvimento de uma relação entre indivíduos, não entre películas.

E agora penso em quais alternativas existem para reverter essa situação...
Como, construídas as películas, desconstruí-las e possibilitar uma relação saudável e verossímil?
Como se fazer entender, se fazer enxergar para além da película criada pelo outro?
Como entender e enxergar além da película criada para o outro?
Como não entrar nessa armadilha e como não colocar o outro nela?

Não busco respostas exógenas.

Só jogo aqui o questionamento...

Pra quem a identificação com o tema for útil, "não tem por onde".

sexta-feira, 6 de abril de 2012

sem ideias [ou necessidade delas] para pôr aqui

Relendo posts antigos e, principalmente, mostrando-os a algumas pessoas, me peguei pensando que eu escrevia muito melhor do que o faço hoje. Não sei dizer ao certo o motivo disso.
Havia, com certeza, muita revolta nos sentimentos que originaram a criação desse blog. Hoje já não sei. Existe revolta? Existe. E existe de uma forma que me parece não deixar de me acompanhar nunca. Mas isso são impressões.
Hoje, porém, uma calmaria...um mar sem ondas, leve, fresco da manhã, de raios de sol pálidos e preguiçosos a se debruçar sobre o véu d'água....

É estranho me sentir assim...calmo. Nada está plenamente resolvido, ainda há muito a se fazer e, com certeza, ainda há muita insatisfação. Mas em meio a tudo isso, essa calmaria...como se tivesse sido dado a mim mesmo o tempo de que talvez eu sempre precisei. Agora ele é meu. Meu para desfrutar sozinho, meu para compartilhá-lo com quem quiser, se eu quiser.

Sem muitas culpas, com bem menos medos. Eu reli os meus textos e senti falta de mim mesmo. Me vi neles, um "eu-puro", primeiro, substancial.

Os textos vomitados me fazem falta. Falam muito de mim, quase como a música arranhada ainda de iniciante nas cordas do violão.

E a falta de sentido aparente também me fazia muita falta.

No fim das contas, o fio aleatoriamente costurado acaba tendo uma forma.

E em meio às formas, a calma.

domingo, 1 de abril de 2012

Explosão
A emoção que explode em cores e sabores
dores e amores
alegrias, tristezas, viéses fugazes que nos acompanham sempre
e sempre
e sempre
e sempre
e sempre

nunca nos deixam, nunca nos abandonam à nossa solidão
a esse solitário viver com nossas emoções
nossas eternas e inseparáveis companheiras

nossas cores
nosso amor

não o dos livros
não o romântico
não o definível

mas o amor vida
que é tudo
é nada
é multi

tantas vertentes
tantas nuances
tudo tanto
e tão poucas divisões

o sentimento é o que nos resta
é o que nos guia
nos completa
nos preenche
nos define

é o que somos
quem somos

nós
nossos sentimentos
multicoloridos
mesmo quando escuros
ou até mesmo ofuscantes

no extremo
no medido
no errante
no certeiro

essa valsa brincalhona que nos leva daqui pra lá
de lá pra cá

entre lágrimas
sorrisos

choros sorridentes
mesmo quando tristes

e choros de dor
mesmo quando alegres

não existe definição
delimitação

o que existe é a vida
e a vida é tudo
e tudo é a vida

nada é deixado de lado
tudo conta

"tudo é caminho"

quarta-feira, 28 de março de 2012

Koan?

Eu acabei de ler um texto interessante, apesar de óbvio, sobre o isolamento de casais em si mesmos e como isso é prejudicial e empobrece e mata pouco a pouco as relações.

Postei o texto no facebook, compartilhado de uma amiga - por quem eu vi o link - e coloquei, pra variar o "a gnt melhor prega o que mais precisa aprender" como comentário de postagem do link.

E me ocorreu outra coisa, enquanto eu lia o que eu mesmo escrevi na hora de compartilhar o link...

Mais do que precisar aprender, no caso do tema desse texto específico, é algo que eu preciso aprender para poder viver de fato....e ultimamente tem se tornado algo essencial, imprescindível,para que eu possa sobreviver até, tão urgente se tornou essa noção e essa vivência para mim.

E isso me trouxe à cabeça...não é estranho o quanto nós sabemos do que precisamos...ou por vezes vislumbramos essa tal necessidade específica, sabemos seus mecanismos, sua necessidade e, ainda assim, nos vemos de mãos atadas sem conseguirmos alcançá-la?

São posturas, pensamentos, atitudes das quais sabemos precisar...são as coisas sem as quais nós sabemos que não conseguiremos viver sem...mas ainda assim, justamente as coisas das quais nós mesmos mais nos negligenciamos...

E o que nos segura? O que nos impede? O que nos faz não fazer algo que no nosso íntimo sabemos dever fazer ou tomar o caminho contrário do que nós sentimos que devemos tomar justo no momento em que nos deparamos com a encruzilhada?

Será que a coisa é tão estúpida como o simples dilema de sacrificar um prazer imediato e fugaz por outro duradouro e consistente?

Será que somos assim tão retardados a ponto de abrir mão do que nos alimenta de fato por puro comodismo imediatista?

É meio ofensivo se for verdade.....

Mas se for também...não haverá muito a se fazer para negar o fato de sê-lo...apenas se nós tentarmos mudar de alguma forma...remar contra a maré.

Fazer exatamente o inverso do que estamos acostumados a fazer e, de uma vez por todas, sair da zona de conforto e ir para a zona de confronto....e não só ficar teorizando sobre os embates aos quais nós nunca nos submetemos.....

é..já fiz isso uma vez e deu certo....

mas falar continua sendo infinitamente mais fácil que fazer...

mas já comecei uma vez....apesar dessa sensação - talvez ilusória - de estar patinando de novo....

preciso voltar pro front de mim mesmo...

ô vida.....

e eu já falei demais...

acho que agora só me resta refletir sobre os koans implícitos de mim pra mim mesmo nesse texto...

é.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Motes...

Encontrar-se é a única maneira de ser no mundo

Da série "A gente melhor prega o que mais precisa aprender"

Roll the dice
if you’re going to try, go all the
way.
otherwise, don’t even start.
if you’re going to try, go all the
way.
this could mean losing girlfriends,
wives, relatives, jobs and
maybe your mind.
go all the way.
it could mean not eating for 3 or 4 days.
it could mean freezing on a
park bench.
it could mean jail,
it could mean derision,
mockery,
isolation.
isolation is the gift,
all the others are a test of your
endurance, of
how much you really want to
do it.
and you’ll do it
despite rejection and the worst odds
and it will be better than
anything else
you can imagine.
if you’re going to try,
go all the way.
there is no other feeling like
that.
you will be alone with the gods
and the nights will flame with
fire.
do it, do it, do it.
do it.
all the way
all the way.
you will ride life straight to
perfect laughter, its
the only good fight
there is.
Bukowski

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

AAAAAAAAAAAAAAAAHHHHHHHHHHHHHHHH!!!!!

Porque tem dias que eu me sinto uma besta icosaédrica [porque "quadrada" parece pouco às vezes]

prontofalei

[é só tédio, é só tédio, é só tédio...]

Mantra

Para repetir até que se torne enfim verdade interior:

        "Aprendi a caminhar; desde então, gosto de correr. Aprendi a voar; desde então, não preciso de que me empurrem, para sair do lugar.
         Agora estou leve; agora, vôo; agora, vejo-me debaixo de mim mesmo; agora um deus dança dentro de mim"

Zaratustra

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Voa, Passarinho!

Pelo jeito acho que o único meio de aprender a voar de verdade é voando.

"Mas eu não sei voar"

"E alguém sabe?"

Não me sinto pronto. Não me sinto completo. Não me sinto preparado.

Agora é ignorar os medos que isso traz e ir à vida mesmo assim...


Travessia...

Confissão

Porque quando as coisas estão do lado de fora, fica mais fácil lidar com elas. Então vamos lá, revelando monstrinhos.

Não sei ao certo se a origem do problema é essa, mas a situação que dispara e me lembra do problema me parece sê-la.

Ensino Fundamental.

Eu sempre me achei muito diferente e, durante um bom tempo, um tanto esquisito, para não dizer bizarro, em relação aos outros.

E esse se sentir diferente acabou refletindo em várias coisas, algumas boas, outras, nem tanto.

Eu fui uma criança mirrada, era um menino baixinho e magricelo que teve puberdade tardia, ou seja, quase um Smeagol em forma de criança.

Eu tinha que ter algum diferencial, algo para me destacar, algo que me fizesse sentir algo além de um verminho em forma de menino.

Por algo que eu insisto em chamar de sorte [por mais que muitos não gostem quando eu coloco na "sorte" essa responsabilidade], eu acabei sendo aquilo que chamam "inteligente". Para o meio onde eu estava, eu era até "muito inteligente, muito mais que a média"

E eu falo em sorte porque eu sempre me vi com uma grande facilidade para entender as coisas na escola e também uma facilidade que cheirava a inata de me comunicar. Eu via nas outras crianças extrema dificuldade nessas duas áreas. Durante muito tempo eu sempre os culpei por suas dificuldades. Como se elas fossem fruto somente de sua incapacidade de se esforçar o suficiente. Até que eu me dei conta que eu mesmo não me esforçava muito, as coisas meio que fluíam, eram naturais. A partir do momento que me dei conta disso, as coisas entraram em pane na minha cabeça, porque eu não me senti mais no direito de considerar a minha "inteligência" um mérito, um merecimento de qualquer ordem. A coisa me veio mais como um "calhou de eu nascer inteligente e numa família que estimulava isso o tempo todo".

Mas o fato é que na escola eu me destacava de alguma forma, apesar de ser um tanto quanto muito preguiçoso com as tarefas e deveres [exceto os de matemática, que para mim eram mais diversão do que qualquer outra coisa..oque eu mais tarde fui conhecer com o termo de "masturbação mental". Era isso a matemática pra mim]. E o fato de conseguir certo desempenho sem me esforçar muito apenas reforçava minha auto-imagem de "pequeno gênio". Essa imagem, entretanto, também era frágil, já que eu sabia do meu parâmetro de comparação: uma escola municipal do interior de SP. Eu sabia que apesar de eu me destacar muito ali, se fosse para uma outra escola, com um sistema de ensino melhor e crianças que tiveram oportunidades melhores que ou semelhantes às minhas [já que as que estudavam comigo na época eram extremamente carentes de oportunidades], eu seria meramente mais um no meio da multidão. O que me deixava confuso. Por um lado seria ótimo, eu deixaria de ser o esquisito que gostava de aprender as coisas e não achava aquela coisa de escola uma chatisse sem tamanho como as outras crianças, seria aceito, encontraria pares, iguais. Por outro, eu perdia aquilo que, para mim, era o que mais me destacava enquanto indivíduo, a minha "superior inteligência".

Calhou que eu terminei o fundamental na mesma escola pública e na mesma situação de marginalização e exclusão.

E qual foi meu ímpeto de reação? Eu me sentia atacado. E como bom animal acuado, resolvi atacar de volta. Me via sendo colocado numa condição de inferior. Precisava me afirmar superior de alguma forma. Usava, então, do que me era fácil e natural: a cabeça. Passei a tentar enxergar que não era eu o inferior pelos meus medos e dificuldades físicas, mas eles eram os inferiores por não acompanharem meu modo de pensar. E tinha pra mim uma certeza de que dali a alguns anos, eu estaria "próspero" na vida, enquanto eles, se não estivessem presos, estariam fadados a subempregos e famílias desestruturadas.

É, eu sei, é uma visão extremamente podre, ainda mais vindo de uma então criança pré-púbere. Mas era o que me vinha à cabeça, fosse digno ou não, belo ou não.

E como consequência disso, me peguei dizendo frases das quais hoje em nada me orgulho e tenho até certa repulsa. Jargões de uma direitez asquerosa como "a massa é ignorante".

Não via no popular e no que era de massa nada que se pudesse extrair de bom. O que era bom era o marginalizado, o excluído, o diferente, único. Não no sentido social, mas no de concepção de mundo. Ou seja, me tornei para mim a medida do que era bom.
[mais arrogante, impossível]

O tempo passou, mudei de escola, me formei no ensino médio, fiz 4 anos de cursinho e ingressei na medicina numa universidade pública.

Ao longo dessa trajetória eram cada vez mais raros aqueles que me fizessem lembrar os meus colegas do fundamental e, pouco a pouco, minha arrogância foi adormecendo. Nunca o fez por completo, mas em comparação à forma gritante e defensiva como ela se apresentava então, a diferença era notória, pelo menos pra mim.

Mas eu disse adormecida, não atenuada. Porque ela ainda está aqui e essa percepção me veio muito forte num tipo de confronto que eu não esperava encontrar, ainda não da forma como veio.

Num dia qualquer eu fui convidado a trabalhar com um grupo. Um grupo que trabalhava com jovens que muito me lembravam os que estudaram comigo no fundamental, os que me julgavam e excluíam [seja por iniciativa ou já reação à minha defensiva]. Esses jovens não me julgaram, nem excluíram. Mas eu percebi que a simples presença deles, a sensação de estar novamente imerso num grupo que tanto me lembrava o algoz do passado me deixava num estado de alerta e de defensiva aterrorizantes. Pensamentos dos mais preconceituosos, prepotentes e excludentes pipocavam na minha cabeça, quase como com vida própria. Meu medo daquilo transparecer veio crescendo de uma forma que estar lá, confinado naquele espaço se transformou numa angústia terrível , ainda que eu não estivesse de modo algum interagindo com nenhum deles.

Qual não foi a minha surpresa quando fui convidado [quase convocado] para permanecer no grupo e dar uma certa continuidade naquele tipo de trabalho?

Irrompeu dentro de mim um sonoro "Não!" E depois, justificativas das mais variadas..."não, não faz sentido, não me sinto bem aqui, não vou fazer algo que eu não me sinta bem", "eu tenho que estar aqui para fazer um bom trabalho,como vou fazer isso sem a disposição de levantar cedo para vir aqui? não posso" ou "para trabalhar aqui eu teria que ter a vontade de vir, como quem deseja uma diversão. E isso me gera algo que beira a repulsa, não posso ficar, não posso"

Mas algum tempo depois, refletindo nas origens dessas frases e das sensações por ela evocadas, me veio clara à mente a imagem da minha turma do fundamental e o medo e a exclusão e a sensação dos piores anos da minha vida, das piores manhãs, os piores despertares.

E aí eu entendi. O grupo me lembrava outro, que me fazia perder certo controle à parte de mim que quer esconder meus preconceitos e minha arrogância. Eu sei que continuando no grupo, eu vou enfrentar uma das minhas maiores dificuldades. Serei forçado a exercitar de fato [ou melhor, desenvolver] algo semelhante à humildade, que eu não tenho, pelo menos não do jeito que gostaria. E lá, serei exposto à mim mesmo, às coisas que não aprovo em mim mesmo, mas que de certa forma também incentivo, pelo conforto da situação.

Auto-percepção é um negócio complicado. Necessário, mas extremamente doloroso.

Talvez eu esteja escrevendo para tentar me redimir da culpa. Ou talvez para encontrar coragem para me enfrentar.

Ou quem sabe, ambos.

"Forgive me Father, for I have sinned"

Nunca tinha entendido direito esse costume católico
Mas diante dessas palavras aqui postas, realmente, confissões dão um certo alívio.

Transcender ao burrinho

Ô coisa complexa esse tal desapego! É ótimo quando se pensa sobre. Praticá-lo já é bem mais ardiloso do que pensá-lo.

Mas é como se algo sempre impulsionasse rumo a ele, a despeito de todo o orgulho e todos os medos que associam o desapego à uma potencial e aterrorizante solidão. Algo me [ou nos] puxa em sua direção. Como uma vozinha resiliente que nunca larga, independente de quão reprimida ela seja.

O pior não é tentar se desapegar de algo, mas tentar romper com a própria noção de apego. Uma tendência a associar o desapego à indiferença e o apego a uma torta demonstração de afeição ou amor [pelas pessoas, coisas, lembranças e por aí vai].

Mas a resposta [pelo menos a minha] está aí...o apego é a fuga da sensação de vazio. É o escape ao não saber lidar com a própria incompletude e, sobretudo, à confusão dessa com a ideia de insuficiência.

É como se falar de apego fosse falar de lentes, de espelhos retorcidos que nos mostram algo de uma forma que os nossos próprios olhos não vêem. Distorções.

Apego não é amor
Desapego não é indiferença
Incompletude não é insuficiência
Imperfeição não é defeito

E como abandonar as lentes e enxergar as coisas com a honestidade orgânica dos nossos olhos?

É estranho enxergar o caminho mas insistir em duvidar dele. Eu sei o que tenho que fazer, sempre soube. Só não sei ao certo o que - e, mais que isso, os detalhados "por quês" para esse "o quê"- me segura, me amedronta.

Mas algumas coisas estão mudando. O exercício de uma certa autossuficiência não é um exercício de solidão, mas de compartilhamento. Os amigos se mostram como os melhores companheiros do desapego e, porque não, do amor em sua forma mais pura.

Entre amigos existe um laço que une, não uma corrente que prende. E o mais estranho para uma mente apegada é perceber que o aparentemente frágil laço mantém muito mais próximo aqueles que amamos e nos amam do que as correntes que criamos no intuito de nos proteger da solidão.

Tudo parece se resumir a um imenso e infeliz tiro no próprio pé

E talvez a resposta já venha vindo.

E talvez o burrinho sete-de-ouro de Sagarana tenha toda a razão. Porque o "o que" eu devo fazer eu já sei, já o "como" entra numa grande complicação.

É o medo, enquanto cavalo alazão tal qual me vejo, da minha força não dar conta de enfrentar a correnteza e a morte [não do corpo, a simbólica] ser meu fim no rio caudaloso. Como lembrar do burrinho [ou se aceitar enquanto burrinho, deixando para trás todas as concepções de potência e virilidade] calmo e frágil, desgastado pelo tempo, que não vence o rio, dança com ele, deixando-se levar, deixando-se conduzir e assim, fazer tranquila sua travessia?

Como lidar com a possibilidade do "talvez agora não seja hora" para as coisas que mais nos anseiam?

É...e a coisa volta para o orgulho e para a arrogância. Para a vontade de controle, esse veneno tatuado pelo meu corpo que não sai nem com bombril.

Na verdade é o medo da surpresa. Medo do inesperado. E se o que vier não for bom?

E o medo da perda, medo do "Não". Medo da dor da perda que se reflete em medo do medo da dor d perda.
[É, eu não só não sei errar como ainda sou pouco iniciado na arte de perder]

Aceitação, de novo, a mesma coisa...

Ninguém disse que ia ser fácil

E o difícil da vida acaba não sendo a vida em si, mas o "eu" nessa história toda.

Esse ente já proclamado também ilusório por tantos pensadores...

Parte de mim espera que ele de fato o seja assim, fantasia. A outra, por medo de não conseguir transcender, ou da transcendência não vir, ou acontecer e não ser o que eu imaginava [ou simplesmente não ser satisfatória], torce, em segredo, para que essa noção de ilusão seja tudo uma grande mentira. E que a verdade recaia sobre o peso das correntes, correntes que eu controlo [ou penso controlar].

Tanta dúvida, né?

[a transcendência não é da alma, não é uma elevação espiritual de qualquer tipo. A transcendência é o burrinho sete-de-ouro e sua irritante tranquilidade perante a vida]

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Origens

Pequeno final de diálogo noturno com a mãe, antes de dormir:
"Preciso retornar às origens"
"É bom"

É engraçada essa sensação de ser um labirinto de si mesmo. Uma caça ao tesouro criado de si para si. Aquela sensação de ter escondido algo tão bem escondido que fica difícil se lembrar onde esse algo foi parar.

Respostas, perguntas, características. Aquelas que eu busco, que eu de certa forma sempre busquei....e, também de certa forma, sempre estiveram aqui em mim. Algumas latentes, outras escancaradas ao meu orgulho que teimava na cegueira caquética para me manter numa confortável estabilidade paralítica.

Sem escoriações, sem cicatrizes, nem calos ou alegrias, escondido dentro da bolha de si mesmo.

E aos poucos, no confronto, na briga, no afago, no abraço, na bronca [da mãe, dos amigos, dos mais que amigos] as respostas vêm, as características, as perguntas....tudo aquilo pelo qual sempre busquei vem vindo à tona...hora devagar, hora repentino...

E nessas horas a natureza cíclica das coisas parece fazer mais sentido do que nossa noção vetorial de realidade. Como se fossem necessários retornos, resgates, para poder seguir em frente, sair da lama, desestagnar.

Aquilo que eu sempre fazia..que por motivos vários acabei parando, reprimindo, castrando, desestimulando...

Quando percebemos que enquanto crianças eramos potencialmente muito melhores do que somos hoje, acho que é hora de revermos algumas coisas, jogar fora certos conceitos...

Fazer resgates

Resgatar a criança

Mas antes disso, o camelo tem de ir ao deserto

E lá, antes, se tornar leão

Para enfim transcender



E viva o retorno do filho pródigo

Viva as origens!

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Flore-Ser

A vida acontece!

Por mais que eu tente fugir dela, por mais que eu tente negá-la...é quando meus ombros deixam de se erguer contra o pescoço em tensão pelo receio das coisas darem errado que as coisas começam, magicamente, a acontecer

Nas palavras do Nando: "Para abrir a Rosa: temporada"

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Auto-tapa

Porque às vezes quando nós mais tentamos acertar é que cometemos os piores erros

"Pára de tentar entender e controlar tudo, seu covarde! Quebra a cara! Você não é de vidro!"

Aos que me acham incapazes de coisas horríveis, sou tanto ou mais que qualquer outro
não sou santo, não sou um anjo, não sou um amor de pessoa
posso ser amável e ter um bom coração
mas de boas intenções o inferno tá cheio, não é assim que dizem?
Pois então...não tem porque ser diferente comigo
Independente de ser ou não um monstro
Isso em si não importa muito, na verdade

Culpa...

É...você precisa parar de tentar

Vai fazer!
"mas e se eu errar?"

pára de ter medo de cair

A dor vem, independente das suas intenções de fugir dela...isso só piora tudo...

terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Tempo

Tempo para aceitar, tempo para acreditar, enxergar saídas, se conformar...

de todas as possibilidades, queria não querer a que não é possível, queria querer outras...quaisquer outras possíveis...

Eu bem sei, existem várias

E a vida está aí...A dor também...Escolher a primeira deveria ser mais fácil...mas nem tanto....

Ou talvez seja? Ou talvez seja eu? Ou será somente luto? Pensei em procurar aquelas etapas do luto pra saber...tentar entender o que acontece aqui dentro....Mas não...me conheço...saber nesse caso seria tentar seguir o modelo....não existe modelo...existe o que eu sinto, o que eu vivo.

Os amigos tem sido o consolo...quando não eles, a escrita, quando não ela, a leitura

É preciso me reaver com o corpo..fazer as pazes com ele...dar-lhe chances...eu bem sei, ele me alegra...é passageiro...mas pelo menos não é o pesado e escuro, pelo menos é um começo, uma alternativa

pelo menos é diferente

eu preciso sair desse quarto

medo de estar fugindo ao sair daqui
medo de estar fugindo do sofrimento saindo daqui
e ao mesmo tempo medo de estar fugindo da vida ficando aqui

é...acho que vou pra rua

"O sofrimento nos une"

O que é triste

Mas ao mesmo tempo, abre portas, abre as pessoas, as aproxima.

É estranho - mas bom - descobrir tanto de tanta gente em tão pouco tempo. (Re)descobrir os amigos, o apoio, o carinho. A fé e o amor que manifestam em mim quando eu mesmo me esforço para sentir isso aqui dentro...

Queria conseguir colher sempre o melhor do sofrimento e da dor.

E é incrível como pessoas próximas se tornam mais próximas e os distantes conseguem chegar perto. Talvez seja eu mesmo. Talvez as defesas estejam cansadas de me isolar...as coisas se abrem...dói....tudo dói...a dor se dissolve nas lágrimas, nos abraços, no uso do corpo para aquietar a cabeça...mas não vai embora

ainda fica um incômodo...

e a impressão da dor que vai voltar...de novo e de novo...até cessar, ou se transformar

é estranho....

é...

não adianta

um dia de cada vez...

ontem deu certo

hoje eu ainda não sei

o dia apenas começou

"as oportunidades estão dadas"

Bora correr, bora andar, bora colher

se houver companhia, melhor

e há...sempre há

sempre houve

é me lembrar de olhar...olhar pra dentro, mas sem fechar os olhos pro mundo

O mundo me salva, mesmo doendo

E mesmo, ultimamente, doendo tanto

Uma vontade fortíssima de conseguir colher tudo o que a dor traz, não só seu sofrimento

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Vôo livre

Quando a única opção de se sentir e ser verdadeiramente vivo é lançar-se à experiência, viver do corpo toda sua expressão

Um dia após o outro
minuto a minuto

buscando a vivência

buscando a si mesmo

sua aceitação

emancipação de si

Shiva

A grande destruição

A aniquilação do que havia, para que se possa construir o novo

Ou que eu possa simplesmente aceitar o inevitável: só existe o novo e ele já estava aqui há muito mais tempo do que eu imaginava...

O terreno baldio que se apresenta aos meus olhos é de um terror indescritível...

Tudo se foi...tudo está indo...

Tantas concepções....

Quando nós enxergamos nossas próprias armadilhas
fica cada vez mais difícil enganar a si mesmo...

Fugir parece impossível

Tanta coisa para destruir
Tanto para remodelar

Tantas concepções

A realidade que se apresenta como possível
Também é a que me causa maior destruição...

Eu que não tenho fé rogo a Shiva que me dê forças

Que me dê coragem para continuar o inevitável
a inevitável destruição

e a aceitação do inevitável

a aceitação do Sim

do amor e da saudade

de mim mesmo, afinal

Luto

mergulhado até os cabelos nas profundezas do luto
Eu luto

contra mim mesmo, contra meus vícios, fantasias, vontades, medos, dores, fantasmas companheiros-melhores-amigos-que-nunca-abandonam

que não me servem mais

depois de doses cavalares de dor e tristeza, mágoa e rejeição

uma certa serenidade triste

e certamente passageira até a próxima enxurrada...

o luto de quem luta

de quem se depara frente a frente com seu pior inimigo
seu maior aliado

"Eu sou meu maior erro

E minha única Solução"

Achava sinceramente que a dor não viria...que toda a dor já teria passado...e só viria agora a calmaria...

Isso só mostrou sua virgindade frente ao sofrimento

Seu primeiro mergulho na dor após anos...tantos que nem mais lembrava quando tinha sido a última vez...

A lembrança de não conseguir fugir da dor atormenta...Dá medo de não conseguir....de não passar, de não acabar...

toda a transitoriedade parecia uma grande mentira...o agora parecia se alongar pela eternidade

No fundo, sempre soube que não era isso....que iria passar..."vai passar", todos sempre disseram....

Saber e sentir se encontram descompassados

Não quero sentir dor

Não posso mais fugir dela

A partir de agora e adiante

Eternamente fadado a si mesmo...

Colhendo as consequências de suas escolhas sem volta

a escolha dolorosa de si mesmo

com um grande e doloroso empurrão da vida....

não consigo me convencer que eu dou conta
não mais

só consigo ir....
e ver onde tudo isso vai dar....

Atirado na vida...

lutando

de luto

In Completo

Tentou se distrair..buscou no dia tudo o que dele podia ser colhido

de tudo, colheu abraços, lágrimas, ouvidos palavras

e dor

muita dor

o amanhecer lhe arrancava a vida do peito, lhe arrancava tudo na certeza da dor que viria lhe dilacerar, todos os dias

o corpo
o peito
a alma

sabia que seriam o amanhecer e o fim do dia. Sabia que seriam seus melhores aliados...seus mais frios algozes.....os momentos em que as distrações sessariam...a fuga sessaria....e tudo o que lhe restava era se deparar com a ausência....a ausência de si somada à ausência do outro....

O quarto enfim de portas abertas parecia-lhe imenso diante da ausência de sua convidada favorita....que não voltaria...que viveria outras coisas, outras vidas, outros amores, não mais o seu...

temia pelo "nunca mais"
temia a morte
a finitude irreversível

se recusava a ela
e às possibilidades

não queria alternativas
não queria dor
não queria outras
outro amor

queria apenas que tivesse dado certo

queria seu pior não ser pior que o alheio

queria muito

queria tudo

sobretudo, não queria a dor

queria despertar

como se de um pesadelo horrível

que ele sabia...era sua mais pura e nova realidade

a invariável viagem sem volta rumo ao vazio

o que encontraria lá dentro? Nunca quis saber, na verdade...

Não existe mais opção

Não existe mais volta

Sua sorte estava enfim lançada

Sem saber mais do futuro

Sabia apenas a funesta dor do agora

a dor do não

o não do outro.

Aberto Para Balanço

O medo de sentar ao piano com apenas minhas duas mãos vazias
A saudade das outras duas que faziam quatro
tentando compor uma sinfonia
Tentando orquestrar ao piano
Com medo de aceitar apenas o som natural do instrumento

Hoje, apenas duas mãos
minhas duas mãos vazias
tentando ouvir aqui dentro a música natural
minha música original
A música do mundo
meu mundo particular

O som singelo de dentro
pálido, fosco e  tímido
meio sem forma
meio sem chão

meio sem saber pra onde ir
meio sem saber de onde veio

fecho-me do meu mundo de dentro
tentando encontrar coragem para cair no já iniciado
a jornada sem volta

às duas mãos vazias
à sensação ilusória e real de insuficiencia
tornar o velado real descoberto

encarar a si mesmo não é fácil

se abrir para se encontrar dentro de si
fora, no mundo

onde começa o de dentro
e onde vem o que é de fora?

o que afinal de contas é real em todo esse vazio?

domingo, 5 de fevereiro de 2012

O círculo dos 99

Às vezes eu fico me perguntando como se dá a noção de satisfação num país comunista, ou numa comunidade tribal. Enfim, em qualquer lugar onde não se tenha essa noção estimulada de acúmulo como nós do mundo ocidental vivemos.

Pra mim que nasceu dentro dessa lógica de pensamento, é até natural pensar que "se posso ter o melhor, por que me contentar com o que é simplesmente bom?". O que de fato nos impede de cessar naquilo que é "meramente bom"?

Eu escuto por aí,  e provavelmente eu mesmo já devo ter dado esse discurso, que essa busca por mais é algo saudável e benéfico, leva ao avanço, à melhoria, à evolução. E normalmente esse impulso pelo melhor em detrimento do que é bom se justifica por essa afirmativa.

Agora pensando, olhando par ao meu quarto, que está uma zona, me veio à cabeça se a preguiça acaba não sendo consequência também desse modo excelentista de pensar. Por que não bastam as coisas estarem bem, existe em mim, assim como em vários outros que eu conheço, esse impulso do excesso que pode se traduzir como a preguiça - o excesso do ócio. Arrumar meu quarto até vai dar trabalho, mas mantê-lo arrumado não. Ações simples, como devolver as coisas em seu lugar ao invés de simplesmente jogá-las de qualquer jeito e onde cair, caiu. Eu as negligencio, e assim como eu, vários também o fazem, porque não me basta o conforto do quarto arrumado, eu quero mais, além. Eu busco o conforto de não ter o menor esforço, nem mesmo o de guardar uma roupa no armário. E é ridículo porque o esforço real de levantar, pegar a roupa e guardá-la é muito pequeno, mas a sua negligência acumulada gera um transtorno muito grande.

Eu posso estar traçando um paralelo absurdo, mas eu vejo essa situação da preguiça como uma busca inconsequente pelo conforto máximo, tal qual a nossa busca por riquezas e conforto, consumo, etc. Ambos seguem uma lógica muito semelhante: são extremamente sedutoras a curto prazo, mas trazem muita dor de cabeça a longo prazo. Será que o nosso imediatismo é a resposta?

Sei lá, virou até modinha agora dizer que a nossa sociedade é imediatista e que isso re relaciona com a velocidade de avanço tecnológico e dos meios de comunicação, produção, trocas de informação em geral. Mas às vezes eu me pergunto se é isso mesmo, ou se todo mundo aceita essa explicação porque ela um dia foi inusitada e explicava muitas coisas - e hoje ela pode acabar se tornando superficial, sem analisar outros possíveis aspectos, afinal, pra que procurar respostas de uma pergunta que já tem pelo menos uma resposta válida, não é?

Não sei exatamente ou com muita certeza o porque do nosso imediatismo. Não sei se ele está na raiz da nossa busca por acúmulos, acho que talvez seja mais questão de estar relacionado do que ser causa mesmo.

Mas o fato é que me intriga essa lógica do querer sempre mais. Se for pensar no próprio avanço tecnológico. Hoje nós vivemos muito melhor do que há um século atrás [não preciso nem voltar muito mais do que isso] em termos de recursos à tecnologia, mas ainda assim não achamos que é suficiente. Se temos um bom celular, um bom carro, o qualquer outro bem tecnológico passível de atualização, todos vão atrás da última versão, desesperados atrás das novidades "essenciais" para a nossa vida mas que, ironicamente, das quais nós não dispúnhamos até saber que elas existiam. Se for parar pra pensar por esse lado, pelo encaminhamento que damos aos avanços tecnológicos, é como se eles nos trouxessem mais angústia do que soluções.

Não estou dizendo pra todos nós voltarmos ao tempo das cavernas, quando a tecnologia de ponta era uma pedra lascada, não é isso. Mas hoje se fala tanto em tantas outras demandas, mais subjetivas - ou não, como no caso do meio ambiente - do que a mera evolução tecnológica pelo mais rápido, maior armazenamento, maior potencialidade [por que no fim das contas nossa vida hoje gira em torno disso: da expectativa e do acúmulo de possibilidades. Vivemos não pelo o que temos - não vou nem falar pelo o que somos, se não a coisa fica muito pior - mas em função daquilo que podemos um dia ter] e, no entanto, essa que eu acredito ser a maior e mais importante demanda é deixada de lado em função da potencialidade da versão 2.0 beta que vai lançar no mês que vem.

Se nós parássemos hoje com a tecnologia que já foi desenvolvida até o momento, teríamos condição de viver bem. Não seríamos imortais, mas como não o somos mesmo, não vejo muito problema em ter uma expectativa de vida de 76 anos ao invés de 87 [E se os esforços hoje utilizados para o avanço tecnológicos fossem canalizados para a disseminação do acesso à tecnologia já existente, talvez poderíamos dar a oportunidade de viver até além dos 70, quem normalmente morre antes dos 35, o que, de fato, faria alguma diferença]

E não me venha dizer que o avanço tecnológico é feito em prol do bem da humanidade que você perde meu respeito pela ingenuidade da afirmaçõ. Se assim fosse, várias doenças que tem dinâmica de contágio e desenvolvimento razoavelmente simples já teriam cura. Hoje muitas delas não tem simplesmente porque é mais interessante e muito mais rentável investir em novas tecnologias de pet scan do que encontrar a cura do mal de chagas.

E eu não consigo não me perguntar, talvez pela influência da tendência marxista nos estudos em humanas da minha geração no Brasil, quem é que realmente ganha com todo esse acúmulo, com todo esse avanço tencológico?

Para onde estamos indo e o que estamos fazendo com a nossa própria vida?

E mais importante que isso - pra mim - porque não conseguimos romper esse ciclo? Falo por mim mesmo. E duvido que haja entre nós alguém, nascido e criado dentro do nosso sistema ideológico, capaz de dizer e cumprir a ideia de viver sem o desejo de acumular, que acaba sendo consequência do desejo de possuir.

Eu não tenho respostas....e eu gosto das perguntas, porque elas mantém a discussão acesa.

Talvez o texto tenha ficado confuso...mas pra isso serve a caixa de comentários também, não é?

Até a vista!

sábado, 4 de fevereiro de 2012

Perdi um tesouro no mar

Perdi um tesouro no mar e não sei onde encontrar

Me perdoem o recurso porco para justificar a rima, mas é que eu gosto de rimas, elas são engraçadas
E eu acho engraçado quando elas são despretensiosas....porque quer coisa mais intencional que rima? ainda mais eu, que gosto delas e meio que as busco de propósito

Mas às vezes eu vejo a rima mais como brincadeira, coisa de gente arteira
sem compromisso, lenço ou documento

A rima é como o tesouro perdido
Aquele da busca infindável

às vezes a rima é a tentativa do tesouro perdido
e talvez por isso mesmo ela saia, por vezes, de forma tão besta...não é mais que uma réplica fajuta do tesouro que provavelmente nunca será encontrado

e ficamos nessa busca
pelas rimas pescadas
degraus de escadas que não dão em lugar nenhum

só existem para manter a busca
a eterna busca

nas profundezas onde eu perdi meu tesouro...

nessa busca que me completa pela diversão

vamo brincá?

Uma questão de geografia

Às vezes nos entorpecemos de tal forma de nós mesmos e a nós mesmos ficamos de tal sorte presos, que o auto-entorpecimento, para cessar, precisa ser substituído...

Às vezes é preciso algo de fora, um outro vício, talvez menor, menos intenso que o vício de si em si, mas que, mesmo temporariamente, livre-nos daquilo que nos cega momentaneamente, o cego ensimesmado.

E na fuga momentânea do interior para aquilo que se encontra fora, não encontramos a nós mesmos se não distorcidos, parecendo outro....o reflexo torto que vemos como algo de fora, uma representação, fiel ou não, de nós mesmos...

No recurso ao momentâneo externo às vezes se encontra a única saída, a única oportunidade para o silêncio de dentro, para a paz... o não pensar que traz, antes de respostas, paz para as coisas voltarem ao lugar...

Caminhar nem sempre é tão fácil quanto parece. Tirar o pé firme ao chão para lançá-lo ao próximo passo soa por vezes inútil e assustador...mas é talvez a única ação possível quando o lugar em que estamos nos incomoda...

Difícil dizer se é mais difícil saber onde se está, para onde se vai ou como...