terça-feira, 9 de agosto de 2011

Cozinha, composições e amor [sem versão para os cinemas]


Eu quero ainda, um dia, um fogão à lenha. Gosto de tudo que faz demorar a arte na cozinha

Eu tenho essa coisa comigo, que ninguém me ensinou, mas todo mundo fala hoje na tv...nessa nova onda do "slow food"
Mas não foi por isso que eu passei a apreciar o tempo das coisas na cozinha, foi pelo o que eu observei cozinhando até hoje.

comida precisa de tempo
sabor precisa de tempo
de preparo
arranjo
paciência

Essa coisa de cozinha é mesmo uma arte, uma bruxaria, tem um quê de alquimia. Mistura-se os ingredientes certos no momento certo, se não a coisa desanda. Dá-se tempo à comida para ela absorver os novos ingredientes e a "poção" engrossar. 


É preciso paciência para cozinhar e é preciso amor. Não necessariamente a alguém, mas ao ato de estar ali, a cozinhar. Esse é o maior segredo do bom cozinheiro.

E  o amor traz a paciência, quando a espera se transforma em vislumbre e o tédio, uma sucessão de saboreios. Vê-se o objeto de amor se desenvolver, mesmo que aos poucos, ganhando corpo, ganhando sabor. E os leves experimentares no meio do caminho, entre o acender do fogo e o servir à mesa.

Desenvolve-se - e é preciso que isto aconteça - uma noção de intimidade com o que se está fazendo. Com a comida, com o fogão, com as panelas e colheres de pau. Assim como qualquer outra forma de relação que envolva uma mínima pitada de amor, é preciso intimidade. O saborear requer intimidade, para transforar o tédio da espera em apreciação.

E talvez com tantas outras coisas também seja assim, como a cozinha e o cozinhar. A música e suas composições também estabelecem uma relação com o seu compositor que exige paciência, tempo, saborear, amor e intimidade. Com as pessoas, do mesmo modo. Os relacionamentos devem ser cultivados como grandes, complexos e saborosos refogados, cozidos ou assados. Talvez mais os refogados e cozidos, que exigem mais atenção, menos "deixar ao fogo", como também seria o caso dos grelhados. No caso da música, não há escolha, é preciso um constante debruçar, um cuidado assíduo, um constante ver, rever, reproduzir e revisar, acertar uma nota aqui, outro ingrediente ali. E desse modo, a música se aproxima mais do amor que a cozinha. Mas o amor se aproxima sempre da cozinha com música.

Amor, música e cozinha.
Tudo tem sabor. Molhos, temperos, notas, acordes, arranjos, carinhos, palavras, conversas, corpos, almas e comunhões.

Tudo é composição. E para todos é preciso arte.
E para a arte, intimidade, paciência e amor.

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